Além da desoneração da folha de pagamento da construção civil, o governo prepara mais medidas de estímulo à economia. O novo pacote será lançado ainda nesta semana, disse o ministro ao sair de audiência de quatro horas na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Ele não quis antecipar quaisquer ações.
Para saber se ele sempre acerta, leia o que ele escreveu em 1994, uma semana depois da implantação do Plano Real:
AS FANTASIAS DO REAL
Diga-se o que quiser do Plano Real, pelo menos num aspecto ele foi bem
sucedido. Conseguiu excitar a imaginação popular e passar a impressão de
algo novo e diferente dos planos anteriores.
Os arquitetos do real não pouparam sua imaginação para lançar velhas ideias
com aparência de novas, como o Comitê da Moeda, Banco Central independente,
ou a dolarização com conversibilidade, mesmo que nada disso tenha sido
utilizado.
Chegaram ao ponto de reinventar os reis ou reais, uma nova moeda fantasiada
do dólar e garantida por um lastro que não exerce nenhum papel prático, uma
vez que o real não é conversível, a não ser o de dar a impressão de que o
real vale tanto quanto a moeda norte-americana.
E todo esse barulho para quê? Para vestir com roupagens sofisticadas e
muitos truques de ilusão, mais um ajuste tradicional, calcado no corte de
gastos sociais, numa contração dos salários, num congelamento do câmbio e
outros ativos e, sobretudo, num forte aperto monetário com taxas de juros
estratosféricas.
A parte mais imaginativa do plano, que foi a superindexação da economia pela
URV, revelou-se a mais perversa, porque passou a ideia de que os salários
estavam sendo perfeitamente indexados e resguardados da inflação. Quando, na
verdade, foram colocados em desvantagem na conversão para a URV em relação a
preços, tarifas e vários outros custos e ainda perderam os reajustes
automáticos que a lei salarial lhes garantia.
De primeiro de julho em diante os salários serão pagos em real, que tem a
aparência de ser uma moeda indexada, como se tivesse herdado as virtudes da
URV, porém é uma moeda desindexada e totalmente vulnerável a corrosão
inflacionária do real.
A regra de conversão dos salários pela média e dos preços, tarifas e outros
custos pelo pico, matou dois coelhos de uma só cajadada. Reduziu
preventivamente a demanda dos assalariados, que poderia aumentar com a queda
brusca da inflação e comprimiu os custos salariais, dando uma folga para os
preços.
Com esses artifícios, os preços têm chance de apresentar alguma estabilidade
por algum tempo, porque desfrutarão de um conjunto de custos estáveis, como
salários, tarifas, matérias-primas importadas, aluguéis e tudo o mais que
foi congelado por até 12 meses, sem a aparência de estar congelado.
E aqui também a ilusão funcionou, porque vendeu-se a ideia de que o plano
não utilizou o congelamento, quando, na verdade, congelou o câmbio, tarifas,
aluguéis e contratos. Só não congelou mesmo os preços e deixou os salários
no limbo de um semicongelamento, com o ônus de correr atrás do prejuízo que
será causado pela inflação do real.
Portanto, mais do que um plano eficiente e bem concebido, o real é um jogo
de aparências, que pode durar enquanto não ficar evidente que as contas do
governo não vão fechar por causa dos juros altos, que o mercado sozinho não
é capaz de conter os preços dos oligopólios sem uma coordenação das
expectativas por parte do governo, que os salários não manterão o poder
aquisitivo por muito tempo, que o real não vale tanto quanto o dólar.
Mas não se deve subestimar a eficiência das aparências e dos jogos de
prestidigitação nas artimanhas eleitorais. As remarcações preventivas dos
preços, junto com os congelamentos, permitirão uma inflação moderada em
julho e, talvez, uma ainda menor em agosto, numa repetição da trajetória dos
preços por ocasião da implantação da URV, que subiram muito em fevereiro, na
véspera da fase dois, elevando os índices de inflação de março, e depois
caíram em abril e só voltaram a subir em maio e junho.
A questão é saber em quanto tempo o grosso da população irá perceber que uma
inflação moderada por si só, acompanhada por um aperto monetário e recessão,
não melhora sua situação, não cria empregos e, na ausência de uma lei
salarial e correções automáticas, pode ser tão deletéria quanto uma inflação
de 30% a 40% com indexação.

