O Engraxate e o Advogado

Artigo de Elenildo Lenon Nunes Rocha, Advogado, Funcionário do BB e empresário.

É incrível o tratamento dado aos Advogados baianos por significativa parcela dos magistrados que atuam no interior do Estado.

A ideia de que o Advogado é indispensável à administração da Justiça, ao que se afigura, parece que só no papel, já que é texto de lei, inserto na Constituição Federal Brasileira.

Aqui na Bahia isso se vê com muito mais clareza que em outros Estados, como o Tocantins, por exemplo, que é muito mais pobre e a coisa não é bem assim.

Há certo tempo atrás, numa sexta-feira, dois Advogados se encontravam sentados naquele conjunto de cadeiras duras e azuis, ligadas umas nas outras, que geralmente são encontrados nos corredores de repartições públicas, desejando falar com um Juiz que atuava aqui na comarca de Luís Eduardo Magalhães, município que ocupa o sétimo lugar na economia baiana.

Frisa-se que as cadeiras que estão dispostas nos corredores do Foro local são as mesmas até hoje.

Um dos causídicos havia chegado pouco depois do início do expediente, beirando às 14 horas. O outro um pouco mais tarde, passando das 15 horas. O expediente iniciava ao meio dia, mas na prática, o magistrado nunca chegava no horário.

Ambos, com problemas distintos, mas com um “sonho” em comum, serem recebidos pelo magistrado. Naquelas horas que passavam mais rápido do que se desejava, o homem de terno com um brasão do tribunal na lapela por vezes saia de seu gabinete, passava em frente aos dois advogados, sem cumprimenta-los, é claro, e, grudado no celular, afinal era seu melhor passatempo.

Eis que surge o engraxate.

Ofereceu seus valorosos e respeitáveis serviços aos Advogados que, naquele momento, quase dormiam nas duras cadeiras de tanto esperar.

Os Advogados disseram não, muito obrigado … e o menino homem, dirigiu-se ao gabinete do magistrado, adentrando sem nenhuma timidez e sem bater na porta, permanecendo por lá aproximados 40 minutos, saindo depois desse feliz da vida. Não se sabe se havia lustrado os já brilhantes sapatos do magistrado ou por ter conseguido o despacho na Ação Cobrança, cujo valor da causa devia ser aproximadamente R$ 3,00, (três reais), o que se presume que um cliente seu deixou de lhe pagar a conta pelo serviço prestado de engraxar os sapatos.

Enquanto isso, o primeiro Advogado esperou até às 18 horas, não mais podendo ficar, pois tinha uma consulta com seu médico naquele horário, indo embora sem ser atendido. Seu colega resistiu bravamente e depois de ser avisado que seria atendido, finalmente conseguiu entrar no Olimpo gabinete, já perto das 18:45hs. Expôs a sua urgência, os motivos e razões que o fizeram esperar tanto. Uma tal de “Tutela de Urgência” (uma Liminar) numa Medida Cautelar. Conseguiu ouvir do “ser supremo” que “é a segunda vez que o senhor traz um problema para o gabinete do juiz” e ainda, “deixe ai o número do processo que eu vero que posso fazer depois”.

Mas a Tutela não era de urgência…?

Conclusão: na Bahia, o Judiciário está acabando com a carreira de Advogado. Já tem gente dizendo que vai deixar a Advocacia para ser engraxate. Tem muito mais prestígio com os magistrados.

 

 

Avatar de Desconhecido

Autor: jornaloexpresso

Carlos Alberto Reis Sampaio é diretor-editor do Jornal "O Expresso", quinzenário que circula no Oeste baiano, principalmente nos municípios de Luís Eduardo Magalhães, Barreiras e São Desidério. Tem 43 anos de jornalismo e foi redator e editor nos jornais Zero Hora, Folha da Manhã e Diário do Paraná, bem como repórter free-lancer de revistas da Editora Abril

4 comentários em “O Engraxate e o Advogado”

  1. Existe uma pequena diferença entre Juízes Federais e Juízes Estaduais. Os primeiros pensam que são Deus os demais tem certeza.

  2. Uma vez quando atuava na função de procurador federal em um órgão, precisava retirar um processo de uma vara federal para interpor recurso. A decisão recorrido foi procedente em parte, mas como o prazo da outra parte era a metade do nosso, fui retira-lo apos o decurso do prazo da outra parte.Na época ainda não havia internet. A secretaria da Vara não permitiu a carga dos autos.Não entendeu a mecânica dos prazos ou foi birra contra a minha pessoa. Depois disso, mais tarde, uma funcionaria de um colega de profissão conseguiu a carga do feito. Eu procurador do órgão contra quem a ação foi proposta,não pude retirar os autos da secretaria, uma pessoa que não era advogada nem funcionaria do aludido órgão pode.

  3. Infelizmente esse é um retrato claro da justiça baiana. Quantos e quantos processos contra a roubalheira pratica por prefeitos e vereadores dormem um sono profundo nas varas sem solução, prejudicando populações inteiras e incentivando ainda mais os desonestos. Quantas e quantas ações urgentes, envolvendo menores, pessoas ameaçadas, crimes terríveis e muitos outros sem a mínima atenção dos semi-deuses. Eu particularmente também conheço histórias de pessoas que desistiram de advogar na justiça baiana e foram buscar outras formas de sustento, às vezes em outros estados.

Deixe um comentário