
Por Marina Amaral, codiretora da Agência Pública, em sua newsletter semanal.
Não durou nem até quarta-feira de cinzas o amor entre Jair Bolsonaro e os brasileiros. A fé de 65% da população que, no dia da posse, disse esperar um bom governo, não resistiu: são apenas 39% os que agora avaliam positivamente o mandato, segundo pesquisa CNT/MDA divulgada nesta semana.
Para além da alta no desemprego e do mau desempenho do PIB, a máscara do capitão anticorrupção escorregou, mostrando um homem acuado.
Depois da exposição de seu filho Flavio, envolvendo funcionários de seu gabinete na Alerj, milicianos e amigos da família, Bolsonaro se afundou em novo escândalo com as fraudes na distribuição de verbas públicas às candidaturas do seu partido (PSL).
A demissão de Bebbiano gerou o vazamento de áudios que, além de desmentirem cabalmente o presidente da República, mostraram leviandade no trato de assuntos governamentais – em família e no whatsapp -, sem falar na qualificação de emissoras de TV como amigas e “inimigas”.
Com a credibilidade do presidente em crise, os liberais que pegaram carona no “mito” Bolsonaro tremem diante da dificuldade de aprovar a Reforma da Previdência sem apoio da opinião pública.
Até seguidores ferrenhos do “mito” responderam na lata a Carlos Bolsonaro, quando ele propagandeava nas redes o projeto da reforma da previdência.
“Seu pai podia fazer uma ‘live’ explicando como se aposentar aos 33 anos de idade”, comentou um deles de acordo com a coluna de Monica Bergamo.
Mesmo que se aceite o achatamento dos benefícios daqueles que trabalham (os ricos, obviamente, não precisam da previdência), como querem governo, mercado e mídia, não há como não se indignar ao ver a ausência do debate sobre esse tema essencial. Infelizmente a imprensa não manteve o ímpeto investigativo em relação a esse assunto: até agora sabe-se muito pouco do que se esperar com a mudança, além do trilhão que seria poupado.
O sistema de capitalização continua a ser uma perigosa incógnita e poucos foram informados – antes da reação contrário da Congresso – do tratamento repugnante reservado aos mais vulneráveis; das mudanças na aposentadoria rural às novas regras para o BPC (Benefício de Prestação Continuada), que hoje paga um salario mínimo a idosos e deficientes em situação miserável.
Não há como imaginar uma reforma previdenciária minimamente justa sem ouvir a sociedade.
É preciso analisar com frieza quem ganha e quem perde com o atual projeto, investigar seu impacto, e dar voz aos cidadãos e aos seus representantes políticos – sindicalistas e movimentos sociais -, até agora ignorados.
E seguir de perto como se comportam os que ficaram de fora, como os militares, cada vez mais fiadores de um governo que soa perigosamente amador.
Ou teremos outros mitos rasgando a fantasia depois do Carnaval.
