
Sentença reconhece que agricultores foram pressionados por liminares fraudulentas, presença de homens armados e risco de perder a safra; réus terão de devolver valores e pagar indenizações.
A Justiça de Formosa do Rio Preto (BA) anulou todos os acordos firmados entre produtores rurais da região da Coaceral e o grupo formado por Joilson Gonçalves Dias, José Valter Dias, Ildeni Gonçalves Dias e a empresa JJF Holding. A decisão, assinada pelo juiz Maurício Álvares Barra, conclui que os agricultores foram obrigados a assinar contratos e emitir Cédulas de Produto Rural (CPRs) sob coação direta, ambiente de insegurança jurídica e um esquema ligado ao escândalo conhecido como Operação Faroeste .
Pressão, liminares estratégicas e clima de “terror psicológico”
Os depoimentos colhidos ao longo do processo descrevem um roteiro de intimidação: liminares de reintegração de posse eram concedidas sempre em períodos decisivos do calendário agrícola, frequentemente acompanhadas da presença de homens armados e ameaças de expulsão imediata das fazendas.
Produtores relataram que a mensagem era clara: ou aceitavam pagar dezenas de sacas de soja por hectare — muitas vezes durante anos — ou perderiam colheitas inteiras e décadas de trabalho.
Segundo a sentença, o esquema transformou agricultores que ocupavam legalmente suas áreas há mais de 30 anos em “arrendatários de suas próprias terras”.
Operação Faroeste: um pano de fundo determinante
A decisão judicial menciona expressamente elementos revelados pela Operação Faroeste, que investigou a atuação de magistrados, servidores públicos e particulares na manipulação de registros de terra e na concessão irregular de decisões judiciais.
O juiz reconhece que esse ambiente criou um fundado temor, condição suficiente para invalidar a vontade manifestada pelos produtores nos acordos.
Anulação das CPRs e condenação ampla
Com a constatação do vício de consentimento, a Justiça também considerou nulas todas as CPRs vinculadas aos acordos, apontando ainda falhas formais na emissão dos títulos.
Os réus foram condenados solidariamente a:
- restituir todos os valores pagos pelos agricultores, corrigidos e com juros;
- indenizar danos materiais e lucros cessantes, a serem calculados caso a caso;
- pagar danos morais, igualmente determinados em liquidação individual.
Reconhecimento de usucapião coletivo é rejeitado
A Associação dos Produtores Rurais da Chapada das Mangabeiras (Aprochama), autora da ação, pediu que a Justiça declarasse inexistente qualquer relação jurídica que impedisse os agricultores de usucapir suas terras. O juiz, porém, afirmou que a usucapião exige análise individualizada, perícias e rito próprio — e não pode ser deferida em uma ação coletiva desse tipo.
Decisão deve repercutir na região
A sentença determina ainda a publicação em edital, já que as CPRs anuladas podem estar nas mãos de terceiros. O caso reforça o impacto jurídico das revelações da Operação Faroeste sobre disputas fundiárias no oeste baiano — e abre caminho para que dezenas de produtores busquem reparações individuais pelos prejuízos sofridos.
