A Saúde entra em parafuso no Rio e pode chegar a outros estados
24/12/2015 – Fonte: O Globo
por Carina Bacelar e Vera Araújo

RIO – Diante do quadro caótico nos hospitais, a Justiça concedeu nesta quarta-feira liminar que obriga o estado a depositar, em 24 horas, todos os recursos destinados por lei à saúde. O governo deve repassar ao Fundo Estadual de Saúde do Rio os valores que faltam para cumprir o percentual de 12% de sua receita no ano, o que daria cerca de R$ 636,1 milhões. A ação foi impetrada pelo gabinete de crise, formado pelos ministérios públicos estadual e federal, pelo Sindicato dos Médicos do Rio e pelas defensorias públicas do estado e da União. Na noite desta quarta-feira, o governador Luiz Fernando Pezão decretou estado de emergência na saúde por 180 dias
A decisão da juíza Angélica dos Santos Costa, do Tribunal de Justiça do Rio, aumentou a pressão sobre o estado que, se não cumprir a decisão, terá que pagar multa diária de R$ 50 mil. O próprio secretário estadual de Saúde, Felipe Peixoto, e Pezão podem ser punidos com multa diária de R$ 10 mil. Em seu despacho, além de afirmar que o governo perdeu o controle sobre suas contas, a juíza diz que, a cada dia, “a situação se agrava com a paralisação de um novo serviço público essencial, caminhando para um verdadeiro colapso do sistema único de saúde”.
GASTO ABAIXO DO QUE MANDA A LEI
De fato, os sintomas dessa rede pública doente se espalham rapidamente. Um caso comoveu as equipes médicas. Sem plano privado, Wilma de Souza Flores, de 81 anos, tem um tumor maligno na região torácica. Depois de passar 15 dias no Hospital Miguel Couto, sem atendimento especializado, precisou que a família recorresse à Justiça para que ela fosse, finalmente, transferida ontem para o Hospital Mario Kröeff, na Penha. Mas lá, com funcionários sem receber salários, as portas estavam fechadas. Depois de três horas dentro de uma ambulância sem ar-condicionado, ela voltou para o Miguel Couto.
– Quando pensei que a nossa via crucis tinha terminado, enfrentamos tudo de novo. É muita maldade – lamentou a sobrinha e afilhada da idosa, a servidora Rosalra de Souza Medeiros.
Na ação movida pelo gabinete de crise, os autores alegam que, até agora, Pezão só gastou 9,74% da receita ativa do estado em saúde, embora a Constituição Federal determine uma margem mínima de 12% para o setor. Segundo o Portal da Transparência da Secretaria estadual de Fazenda, o governo autorizou gastos de R$ 5,15 bilhões do orçamento do setor. No entanto, só R$ 3,7 milhões (73%) foram efetivamente pagos.
Presidente da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas (ANTC), Lucieni Pereira explica que, se descumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal, Pezão pode responder por crime comum, de responsabilidade e improbidade administrativa:
– Se as contas forem julgadas irregulares, a Lei da Ficha Limpa prevê a inelegibilidade do gestor público por oito anos.
Pezão foi buscar apoio político da presidente Dilma Rousseff, com quem conversou pela manhã por teleconferência. Depois disso, Dilma criou um segundo gabinete de crise, este só com integrantes dos governos federal, estadual e municipal. O secretário nacional de Atenção à Saúde, Alberto Beltrame, veio para o Rio. Ao mesmo tempo, o prefeito Eduardo Paes anunciou um empréstimo de R$ 100 milhões para manter em funcionamento dois hospitais estaduais, o Rocha Faria, em Campo Grande, e o Albert Schweitzer, em Realengo. O anúncio ficou por conta do secretário-executivo de Coordenação do Governo municipal, Pedro Paulo de Carvalho, candidato à sucessão de Paes. Segundo ele, o estado terá até o fim do primeiro semestre de 2016 para pagar o empréstimo.
