Organizações pedem que Governo revogue autorização para desmatamento de 24.732 de hectares no Oeste baiano

A área, maior que a cidade de Recife (PE), está localizada em uma Unidade Estadual de Conservação no Condomínio Agronegócio Fazenda Estrondo, acusado da apropriação de 444 mil hectares de terras tradicionalmente ocupadas por comunidades geraizeiras.

Cinquenta e seis organizações da sociedade civil enviaram, na última quarta (1/9), uma carta aberta ao Governador do Estado da Bahia, à Secretaria de Meio Ambiente e a Coordenação de Desenvolvimento Agrário exigindo a revogação da Autorização de Supressão de Vegetação (ASV) de 24.732 hectares de vegetação nativa, requerida pela empresa Delfin Rio S/A Crédito Imobiliário para o “Condomínio Cachoeira do Estrondo”, no município de Formosa do Rio Preto (BA). O caso figura como uma das maiores supressões em curso no Brasil.

Conforme imagens obtidas da Plataforma MapBiomas, até o dia 17 de agosto já haviam sido desmatados cerca de 3000 hectares.

Segundo a carta aberta, a ASV foi irregularmente autorizada pelo Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (INEMA) através da Portaria nº 18.440 do dia 22 de maio de 2019. A carta alerta para o fato de que o empreendimento nunca conseguiu demonstrar a regularidade fundiária de sua posse e sobrepõe, ilegalmente, a sua Reserva Legal obrigatória aos territórios tradicionais dos geraizeiros – descendentes de indígenas e quilombolas, que vivem de forma tradicional e sustentável no cerrado.

A empresa comete um caso típico de grilagem verde, usurpando domínios alheios para fingir a regularidade ambiental de determinado imóvel”, diz trecho da carta. O documento destaca que foram ignoradas as decisões judiciais que definem a posse das comunidades na área objeto da ASV. As comunidades nem sequer foram consultados. Tampouco, não houve consultas nem ao Comitê Gestor da Unidade Estadual de Conservação da “APA Rio Preto”, nem à Coordenação de Desenvolvimento Agrário (CDA), órgão responsável do Estado pela regularização fundiária.

Os impactos da ASV em questão vêm sendo piorados por duas supressões autorizadas pelo INEMA, concedidas às glebas Agropecuária Canadá S/A e Agropecuária Fronteira S/A. As duas áreas integram o Condomínio Estrondo. Executaram o desmate de 2.500 hectares nas cabeceiras do Rio Preto, onde o rio se forma. Pelas previsões das comunidades tradicionais da região, as supressões provocarão desmoronamentos das serras circundantes e o sucessivo aterramento das nascentes do rio.

A expectativa é que o INEMA revogue imediatamente a ASV, faça uma visita in loco para registrar a denúncia e notifique a empresa a interromper imediatamente o desmatamento iniciado, sem prejuízo da determinação de reparações ambientais e aplicação de novas multas.

A execução desse desmatamento, na forma como foi autorizado, além das consequências devastadoras para conservação da biodiversidade, provisão de água e recarga de aquífero, manutenção dos meios de vida das populações geraizeiras, certamente compromete a idoneidade do processo de concessão de ASV no Estado da Bahia”, concluem as organizações.

Fazenda Estrondo

Considerada pelo Livro Branco da Grilagem (Incra/1999) um dos maiores casos de grilagem no Brasil, o latifúndio registra em seu histórico o descumprimento de leis e decisões judiciais, autuação por desmatamento e trabalho análogo ao escravo, atentado com arma de fogo contra geraizeiros por parte de funcionários de segurança privada, além de outras violências e violações de direitos individuais e coletivos, como ameaças, agressões e sequestro relâmpago de lideranças comunitárias.

O empreendimento, constituído por 22 empresas produtoras de soja, algodão e milho para exportação, possui silos das empresas Bunge e Cargill e já ocupa 315 mil hectares (área três vezes o tamanho da cidade de Nova York). As terras estão localizadas às margens do Rio Preto, na divisa entre Bahia e Tocantins, região que integra a fronteira agrícola do MATOPIBA.

Texto de Morgana Damásio, jornalista inscrita no DRT sob nº 0005534/BA. Fotos de Thomas Bauer.

Veja aqui a carta enviada ao Governador, seu inteiro teor e os respectivos signatários.

Um dos maiores casos de grilagem do Brasil é tema de Audiência Pública

O conflito envolve a Fazenda Estrondo e comunidades gerazeiras da região do MATOPIBA. A audiência está marcada para a próxima quarta-feira, dia 30, às 14h, na Câmara dos Deputados.

Para dar voz às comunidades geraizeiras de Formosa do Rio Preto (BA), atingidas pelo grande empreendimento da Fazenda Estrondo, na região Oeste da Bahia, e exigir maiores providências do Estado, no próximo dia 30, às 14h, será realizada na Câmara dos Deputados, em Brasília, Audiência Pública para debater a situação que já se configura, segundo o Livro Branco da Grilagem do INCRA, como um dos maiores conflitos de grilagem do Brasil.

Na Audiência, que acontece no âmbito da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM), estarão presentes representantes das comunidades, organizações da sociedade civil e parlamentares.

Há cerca de 40 anos, um dos maiores conflitos por território do Cerrado se depara com descumprimentos de leis e de decisões judiciais, violências institucionais, ameaças e perseguições contra comunidades geraizeiras de Formosa do Rio Preto.

O caso envolve o Condomínio Agronegócio Fazenda Estrondo, uma das maiores produtoras de soja, algodão e milho do Brasil, onde estão presentes silos das empresas Bunge e Cargill.

O empreendimento é acusado da apropriação ilegal de 444 mil hectares de terras nas proximidades da nascente do Rio Preto, região com terras tradicionalmente ocupadas pelas comunidades.

A Fazenda também já foi autuada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por desmatamento ilegal, além dos registros de autuação por trabalho análogo ao escravo.

De acordo com a Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (AATR-BA), que acompanha o caso, o conflito se acirrou nos anos de 2010 e 2012, com as discussões sobre o Novo Código Florestal.

Mesmo depois da expedição da liminar de proteção possessória de 43 mil hectares a favor das comunidades em 2017, as violências não cessaram. Denúncias de prisões ilegais e ataques a tiros contra geraizeiros, executadas pela empresa de segurança patrimonial Estrela Guia, contratada pela Estrondo, já apareceram e contam com a omissão do Estado da Bahia.

As 120 famílias que habitam a região do Alto do Rio Preto, descendentes de indígenas e quilombolas, vivem por meio de um modo de vida tradicional e sustentável. Há mais de 200 anos, trabalham com a colheita de frutos e plantas do Cerrado e com a criação de gado.

“Mesmo com uma ocupação tão antiga, a gente encontra grande cobertura de Cerrado nesses territórios, o que demonstra que o modo de vida dessas comunidades concilia produção com conservação”, comenta Isabel Figueiredo, do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), umas das organizações que acompanha o caso.

Com o conflito instaurado, as práticas de vida das comunidades geraizeiras da região vêm sendo prejudicadas. Além disso, a produção da Estrondo provoca prejuízos ecológicos para o Cerrado, bioma mais ameaçado do Brasil, ao contaminar cursos d’água e gerar desmatamentos de enorme escala.

Segundo dados do MapBiomas, a savana brasileira já perdeu 29 milhões de hectares de vegetação nativa nos últimos 34 anos, ou seja, um terço de tudo o que foi desmatado no Brasil nesse período. Uma das principais causas desse cenário é a produção extensiva de monocultivos, principalmente do eucalipto, da cana-de-açúcar, soja e algodão, esses dois último carros-chefes das commodities da Estrondo.

Serviço
Audiência Pública sobre a Violência Institucional e a Perseguição contra Comunidades Geraizeiras de Formosa do Rio Preto
Anexo II – Câmara dos Deputados, plenário 9
30 de outubro de 2019, às 14h.

Mais um capítulo da história de fraudes e violência na Fazenda Estrondo

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No próximo dia 14 de dezembro, o Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) poderá restabelecer o registro original de cerca de 300 mil hectares de terras no oeste do estado, atestado em um inventário de 1890.

Essa é a expectativa do advogado João Carlos Novaes, que defende o atual proprietário das terras, José Valter Dias. A origem da propriedade das terras é atestada no inventário, que teria sido fraudado em 1977.

O caso é caracterizado como grilagem, uma prática considerada frequente no oeste baiano. Para fazer a fraude, os grileiros, na época, “ressuscitaram” e “mataram” um dos primeiros proprietários da área, Suzano Ribeiro de Souza, morto em 1890, para criar um novo inventário. Conteúdo do Bahia Notícias, onde o leitor poderá ver a matéria completa

Leia mais sobre o assunto aqui e também aqui.

Decisão do CNJ vai mudar propriedade de terras em 405 mil hectares no Oeste

foto do Diário do Oeste
Ronald Levinsohn. Foto do Diário do Oeste

O desembargador José Olegário Monção Caldas, corregedor das comarcas do interior do Estado da Bahia, despachou, no final de janeiro, a pedido do Conselho Nacional de Justiça, determinação para cancelamento de matrículas imobiliárias originárias da Comarca de Santa Rita de Cássia, atualmente sobre o domínio da Comarca de Formosa do Rio. Só uma dessas matrículas, a de nº 736, bloqueada para novos desmembramentos, importa numa área de 405 mil hectares de terra, inclusive parte da fazenda Estrondo, que ficou durante muito tempo sob a posse, nem sempre mansa e pacífica, de Ronald Guimarães Levinsohn, ex-banqueiro e dono de faculdades no Rio de Janeiro, como a UniverCidade, hoje em processo falimentar.

Veja o despacho do Magistrado:

“Cumpra-se o quanto determinado pelo Conselho Nacional de Justiça nos autos do Pedido de Providencias nº 0005110-87.2012.2.00.0000. Expeça-se os mandados determinando que o Oficial do Cartório do Registro de Imóveis e Hipotecas da Comarca de Santa Rita de Cássia proceda: a) seja averbada na matricula nº 736, aberta em 30.12.1978, a proibição de novos desmembramentos e eventuais remanescentes, a vigorar até que se apure, pelo procedimento próprio, a eventual existência de remanescente; b) o bloqueio imediato da matricula nº 3773, aberta em 25.05.1987, até a verificação da regularidade do procedimento de retificação, sem prejuízo da verificação da correção do procedimento adotado para a sua abertura; c) o bloqueio imediato da matricula nº 5279, aberta em 01.03.1966, para que não sejam promovidos novos desmembramentos sem prévia e regular apuração de remanescente. Expeça-se os mandados determinando que o Oficial do Cartório do Registro de Imóveis e Hipotecas da Comarca de Formosa do Rio Preto proceda: a) seja averbada na matricula nº 1282, aberta em 26.06.1998 e matricula nº 1287, aberta em 07.04.1998, a proibição de novos desmembramentos e eventuais remanescentes, a vigorar até que se apure, pelo procedimento próprio, a eventual existência de remanescente; b) o bloqueio imediato das matricula nº 616, aberta em 27.08.1993, matricula nº 617, aberta em 27.08.1994, matricula nº 668, aberta em 17.05.1994, matricula nº 1132, aberta em 21.11.1997 e matricula nº 1239, aberta em 19.06.1998, até a verificação da regularidade do procedimento de retificação, sem prejuízo da verificação da correção do procedimento adotado para a sua abertura. Determino, ainda, que os Senhores Oficiais do Registro de Imóveis e Hipotecas das Comarcas de Santa Rita de Cássia e Formosa do Rio Preto, após o cumprimento dos mandados, dêem ciência aos atingidos, o que poderá fazer por qualquer meio hábil, inclusive pelo Correio. Expedidos e encaminhados os mandados, retornem os presentes autos ao Juiz Auxiliar da 2ª Região para a adoção das demais providências determinadas pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ.”