Porque não sou “70%”, “juntos” ou qualquer coisa parecida

Artigo de Fernando Horta, graduado em História pela UFRGS e com mestrado em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília

Uma das maiores mentiras do século XX é a de que podemos separar “política” da “economia”. Consolidou-se uma visão advinda da Guerra Fria de que há assuntos “técnicos” e assuntos “políticos”. Sobre os políticos caberia “discussão”, “liberdade de opinião e pensamento” e até – veja só – uma certa democracia com um pouquinho de participação popular. Nos assuntos “técnicos”, aí opinam os “técnicos”.

Esta falsa dicotomia foi a tônica de todo o século XX. É uma releitura pobre da diferença weberiana entre “ciência” e “política” como duas vocações diferentes. Um é o saber “preciso”, “exato” e “científico”. A outra é o ramo do “achismo”, da “opinião” e das “disputas políticas”.

Daí que algumas pessoas fazem uma escolha bastante política sobre o que colocar na cesta dos assuntos “técnicos” e na dos “políticos”. E querem enfiar goela abaixo esta divisão de coisas que já é – em si mesma – uma decisão política ditatorial tão ruim quanto o próprio fascismo.

De repente, 70% das pessoas no Brasil passaram a fica incomodadas com Bolsonaro. Pergunte-se: que informações não existiam em 2016 para que esta mesma “frente ampla” não tenha sido pensada lá atrás, quando o país tinha na memória recentíssima crescimento, inclusão e distribuição de renda?

O que não estava dito ou posto em 2016 – e que passou a estar nos últimos 30 dias – que pode ter o condão de fazer milhões de pessoas agora se juntarem para formar “70%”?

A resposta desta pergunta é exatamente o motivo de eu não aderir a movimentos políticos que estão se aproveitando do desespero para separarem Guedes de Bolsonaro.

Estes “neopreocupados” com o fascismo querem um governo Bolsonaro sem Bolsonaro. Um governo Bolsonaro sem Bolsonaro é um governo Mourão-Guedes. Em que continue a destruição econômica que nos trouxe até aqui, a criminosa concentração de renda, o desmonte da educação e da saúde públicas, a “guerra contra a corrupção” como Moro e Dallagnol faziam e que nos livremos apenas da mixórdia bolsonarista e seus arrotos fascistas.

Em vez de falarmos em “frente ampla”, precisamos discutir a “agenda mínima” político-econômica para o Brasil.

Eu não aceito unir forças com ninguém que não esteja disposto a abraçar o projeto de renda mínima cidadão, o fortalecimento da educação e saúde públicas e a contenção completa dos abusos de militares e juízes.

Guedes e Bolsonaro são duas metástases do mesmo câncer. Irmãos siameses na perversidade e ignorância. Defender as reformas neoliberais é defender o retorno do fascismo em pouco tempo. Trocar Bolsonaro por Mourão é seguir o golpe “banho-maria” que vivemos até que o dia volte a virar 21 anos.

Hoje te querem como bucha de canhão contra Bolsonaro, o inaceitável. Amanhã você será o próximo “inaceitável” ou, pior, a próxima bucha de canhão.

O jogo das elites é imoral, é asqueroso e não descansa nunca.

Que se matem contra Bolsonaro, eu só me movimento se o preço da batalha for um mundo melhor, e não apenas um mundo sem Bolsonaro.

Certas frases resumem a trozoba toda

“Uma das características da boçalidade é a incapacidade de raciocínios mais complexos. Outra, é ser orgulhosa da sua própria ignorância.”

Fernando Horta, autor da sentença, é historiador, graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e pós-graduado em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília.

É grave o momento político do País. Tente entender a sequência dos fatos.

Fernando Horta – de casaco bege – em entrevista à TV Justiça

Fernando Horta, professor, historiador, articulista e doutorando em Relações Internacionais da UnB, escreve:

Os fatos são ruins em separado. Mas olha só o que acontece quando colocamos todos juntos

2007 – Descoberta do pré-sal, estimada em 20 trilhões de reais
2008 – Maior crise da história do capitalismo, prejuízo de 22 trilhões de dólares
2009 – Começo obscuro e desconhecido da operação lava a jato
2010 – Crise do Euro
2009-2012 – Discussões e votação do marco do pré-sal totalmente nacional e verba para educação
2012/out – Dilma usa bancos públicos (BB e Caixa) para forçar a queda da taxa de juros que chega ao recorde de baixa de 7,25%
2012-2013 – Espionagem da NSA sobre a presidenta e os principais diretores da Petrobras
2013 – passeatas contra o “governo” fazem cair a aprovação de Dilma de 80% para 40%
2014/mar – primeira fase da lava a jato.
2014/out – Reeleição de Dilma
2014/nov – Criação do MBL
2014-2015 – Congresso paralisa, empresários param de investir, mídia ventila a narrativa da crise
2015/set – PEC da bengala previne Dilma de indicar novo membro para o STF
2016 – Lava a jato ataca o núcleo do partido no poder
2016 – Impeachment de Dilma, STF se cala
2017 – Morte de Teori Zavascki/indicação de tucano para o STF, mudança no marco regulatório do pre-sal, fim da previdência, das leis trabalhistas, da educação universal e do SUS
2017 – Comandante militar moderado sofre com problemas de saúde e sinaliza que vai se afastar. Linha dura cotada para assumir
2017/maio – Projeto de lei adiando eleições (possivelmente) para 2020
2017/maio – Exercícios militares “conjuntos” Brasil EUA na Amazônia.
2017/abril-maio – prisões de manifestantes pelo Brasil afora, chacinas de índios, ataque a lideranças sindicais.

Está fácil de entender, não está?