Gesivaldo Britto é alvo de reclamação no CNJ por irregularidades na designação de juízes. Decisões suspeitas transferiram 366 mil hectares de terras a um único homem no Oeste da Bahia
O presidente do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), Gesivaldo Britto, virou alvo de reclamação disciplinar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pela acusação de irregularidades ao nomear juízes para as comarcas de Formosa do Rio Preto e Santa Rita de Cássia, no Oeste do Estado.
A reclamação foi motivada por uma série de atos administrativos e decisões judiciais que transferiram a propriedade e a posse de 366 mil hectares de terra a um único homem, José Valter Dias. A área equivale a cinco vezes o tamanho da cidade de Salvador. Cerca de 300 produtores de soja que estão nas terras desde a década de 1980 estão sendo prejudicados.
A reclamação disciplinar foi apresentada pelo deputado federal Valtenir Pereira (MDB-MT), membro da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, e pelo ex-deputado Osmar Serraglio (PP-PR), que integrou a comissão. Em dezembro, uma audiência pública promovida pelo órgão denunciou a existência de graves mecanismos sistêmicos de grilagem de terras no Oeste da Bahia, “havendo fortíssima suspeita de ilícitos por parte de membros da magistratura baiana”, conforme relata a reclamação.
Segundo o documento, o presidente do TJBA tem designado juízes para o Oeste do Estado “em afronta aos critérios legais e com o único intuito de beneficiar o casal José Valter Dias e Ildenir Gonçalves Dias.”
A reclamação disciplinar inclui ainda as juízas Marivalda Moutinho e Eliene Oliveira, acusadas de praticar “atos absolutamente ilegais, em absoluto prejuízo à confiabilidade do sistema de justiça.” O juiz Sérgio Humberto de Quadros Sampaio também é mencionado.
No dia 1 de março, o CNJ anulou uma portaria de 2015 do TJBA que transferia a propriedade dos 366 mil hectares a José Valter Dias e cancelava cerca de 300 matrículas (registros de imóveis) de agricultores locais.
O presidente do TJBA apresentou recurso contra a decisão, defendendo que as terras permanecessem com José Valter Dias. Não oteve sucesso. Logo em seguida, ele nomeou a juíza Eliene Oliveira – que até então atuava em juizados especiais em Salvador, a 1.000 km de distância – para atuar em caráter excepcional, a partir de 27 de março, em Formosa do Rio Preto.
Duas semanas depois, a juíza Eliene Oliveira deu uma liminar contrariando a decisão do CNJ e transferindo novamente os 366 mil hectares a José Valter Dias.
A liminar foi suspensa esta semana pela desembargadora Ilona Márcia Reis.
A reclamação aponta que Eliene Oliveira concedeu a liminar sem sequer ouvir os agricultores, o Ministério Público ou o ICMBio – que é parte interessada já que as terras requeridas por Dias envolvem uma parcela importante de uma reserva ambiental, a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins.
Os juízes Sergio Sampaio e Marivalda Moutinho também deram decisões semelhantes, que tornaram José Valter Dias um dos maiores latifundiários do Brasil, sem que as outras partes interessadas sequer fossem ouvidas. As irregularidades apontadas também incluem o fato de que os juízes deixaram de analisar ou enviar ao TJBA pedidos de suspeição apresentados contra eles, optando por julgar os processos assim mesmo – ao contrário do que manda a lei.
A reclamação menciona sessão recente do pleno do TJBA em que diversos desembargadores questionaram os critérios de Gesivaldo Britto ao designar os juízes Sérgio Sampaio e Marivalda Moutinho para a região – o que desagradou o presidente da corte baiana.
“A designação ad hoc de magistrados com evidente intenção de atendimento aos interesses do casal Dias se assemelha a verdadeiro tribunal de exceção”, afirma a reclamação.

