Em ‘O Sabotador’, Malu Gaspar explica “como Bolsonaro agiu para boicotar a vacina”

Longo texto da repórter do ‘Piauí’ explicita todos os movimentos do governo contra a imunização no Brasil e prova porque no exterior estamos sendo chamados de calamidade sanitária.

Afinal, o que Bolsonaro está querendo ao sabotar a vacina? Como responderá pelo aumento crescente de mortes? Está querendo fazer negócios com o setor privado para amealhar recursos para a campanha de 2022?


Jair Bolsonaro fora do Congresso Nacional em Brasília nesta quarta-feira © AFP via Getty Images

 “O ilustríssimo capitão deve estar muito feliz comigo”, dizia um triunfante João Doria na sexta-feira, 8 de janeiro, para quem o questionasse sobre o resultado da batalha travada na véspera.

No dia anterior, em entrevista coletiva, o governador de São Paulo anunciara o envio à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) do pedido para uso emergencial da CoronaVac, a vacina que o Instituto Butantan produzira em parceria com a farmacêutica chinesa Sinovac.

Era o último passo para começar a vacinação no Brasil. Na entrevista, o público foi informado sobre alguns dados da vacina, mas o mais importante – a taxa geral de eficácia – não apareceu. A falta de transparência gerou críticas generalizadas, mas a notícia de que o país teria um imunizante em breve, assim que a Anvisa desse o sinal verde, deu ao evento ares de celebração.

Consciente da importância do momento num país que naquele dia chegara a 200.163 mortos na pandemia, Doria caprichou no discurso, com voz embargada e olhos marejados:

“Hoje, 7 de janeiro, é o dia da vida, é o dia da existência. Com todos os cuidados que ainda deveremos ter ao longo deste ano, mas temos a esperança, a esperança da vacina. E a esperança ajuda a fé, a confiança melhora a sua imunidade, porque o seu coração pulsa melhor, porque muito em breve você terá a sua vacina.”

Não demoraram a surgir memes em que Doria era retratado como herói. Outros resgataram o funk do paulista MC Fioti, um hit em 2017, que diz: vai com o bum bum tam tam/vem com o bum bum tam tam.

Dias depois, o próprio funkeiro aproveitou a maré e fez um remix em defesa da vacina no qual bum bum tam tam se associa a Butantan. A audiência explodiu. Doria amou e parabenizou o artista pelo “sucesso retumbante, butantante”.

Em outra paródia, feita pelo músico carioca Edu Krieger, da canção Vitoriosa, de Ivan Lins, a letra dizia que a “Covid até me fez torcer pro Doria”.

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A responsabilidade do campo democrático para evitar a catástrofe

Por MARCOS NOBRE, na Piauí.

Jair Bolsonaro sempre teve clareza de que chegou ao poder por uma confluência única de circunstâncias, uma janela no tempo difícil de se repetir. Desde que se elegeu, tem apenas duas preocupações: evitar o impeachment e se reeleger. A tática para atingir suas metas é a mesma: manter o sólido apoio de uma parcela do eleitorado que não é maioria, mas que é grande o suficiente tanto para resistir a um impeachment como para chegar ao segundo turno em 2022.

A partir do terceiro mês de mandato, a parcela que apoia o atual presidente se estabilizou em torno de um terço do eleitorado. Mesmo que o apoio venha a cair para um quarto dos eleitores, ainda assim Bolsonaro tem boas chances de ser bem-sucedido. O sinal vermelho para seu projeto só acenderá caso caia abaixo desse patamar.

A grande ameaça está no fato de que o duplo objetivo – evitar o impeachment e conseguir a reeleição – não é um fim em si mesmo. É apenas um meio. O objetivo real de Bolsonaro é destruir a democracia. Manter-se no poder e vencer a eleição em 2022 são apenas requisitos para alcançar esse objetivo maior.

É claro que esse roteiro pode mudar. Bolsonaro pode tentar um golpe antes de 2022. Mesmo que seja uma tarefa ainda mais difícil neste momento de dispersão e de fragmentação, as forças democráticas têm de se preparar como puderem também para isso. Este texto é otimista. Acredito que, pelo menos por enquanto, as condições para um golpe não estão dadas e que está mantido o roteiro de destruição da democracia pela via eleitoral.

Apesar de todas as indicações, tem muita gente que ainda duvida de que o objetivo de Bolsonaro seja destruir a democracia. Os atos e palavras antidemocráticos do atual presidente não passariam, segundo essas pessoas, de “arroubos”. Outra parcela da sociedade acha que “as instituições democráticas” irão mantê-lo na linha. Porque, afinal, Bolsonaro continua apostando em eleições. E está realizando o que prometeu durante a campanha de 2018.

Mas o que Bolsonaro prometeu em 2018 foi exatamente isso – destruir as instituições democráticas. Na campanha, as “instituições democráticas” eram “o sistema”. E o sistema é “de esquerda”. O liberalismo que ele abraçou é meramente econômico – Bolsonaro tem ojeriza ao liberalismo político. Entre outras razões, é por isso que não passa de conversa fiada dizer que se trata de um governo “liberal na economia e conservador nos costumes”. É um governo liberal na economia e antiliberal em política.

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