
O prédio da Justiça Federal em Curitiba e abaixo o prédio do MPF: uma trama bem urdida para condenar indiciados na Operação Lava Jato fora dos autos
Conversas indicam que Deltan discutiu com o então juiz medidas para evitar desgaste por divulgação de planilhas com políticos
A parceria entre The Intercept Brasil e a Folha de São Paulo, rendeu a primeira grande reportagem, publicada hoje, depois da checagem de todos os textos vazados e em posse dos dois veículos de comunicação. Reportam os jornalistas do Intercept:
“Após as primeiras reportagens sobre as mensagens, publicadas pelo Intercept, no dia 9, Moro e os procuradores reagiram defendendo sua atuação na Lava Jato, mas sem contestar a autenticidade dos diálogos revelados.”
A versão só seria mudada dias depois, quando Moro e os procuradores, escreve a Folha, “passaram a colocar em dúvida a integridade do material, além de criticar o vazamento das mensagens”, sem, no entanto apresentarem “nenhum indício de que as conversas reproduzidas sejam falsas ou tenham sido modificadas.”
Exatamente como nós fizemos quando recebemos o arquivo, a Folha utilizou vários métodos jornalísticos para confirmar a autenticidade do acervo.
A Folha explica, hoje, em seu editorial: “Os repórteres, por exemplo, buscaram nomes de jornalistas da Folha e encontraram diversas mensagens que de fato esses profissionais trocaram com integrantes da força-tarefa nos últimos anos, obtendo assim um forte indício da integridade do material.”
A primeira reportagem publicada pela Folha em conjunto com nossos repórteres reforça mais uma vez a série de artigos que estamos levando ao público nessa primeira leva de textos: a proximidade entre o ex-juiz Moro e os procuradores da Lava Jato era tamanha que Moro não pode mais alegar ter feito seu trabalho com isenção e independência, deveres básicos de qualquer juiz que tem por ofício respeitar a lei.
Em seu texto, o jornal conta como os procuradores se articularam para proteger Sergio Moro e evitar novas tensões entre o então juiz da Lava Jato e o Supremo Tribunal Federal, apenas um dia depois de Moro ter sido repreendido pelo STF por ter divulgado ilegalmente uma conversa entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a então presidente Dilma Rousseff.
O atrito com o Supremo foi causado pelo que Moro chamou de “bola nas costas” da Polícia Federal: no dia 22 de março de 2016, a PF tornou públicos documentos da Odebrecht de um processo que corria em Curitiba. O material foi divulgado pelo jornalista Fernando Rodrigues antes que Moro pusesse tudo em sigilo novamente. A divulgação de vários nomes de investigados com foro privilegiado obrigaria o ex-juiz a remeter parte do processo ao STF, coisa que Moro não parecia disposto a fazer.
Moro reclamou com Deltan Dallagnol no Telegram. “Tremenda bola nas costas da Pf”, disse. “E vai parecer afronta [ao STF].”
Horas depois, após discutirem juntos uma estratégia – em mais uma prova de que juiz e procuradores trabalhavam em conjunto fora dos autos, o que é ilegal –, Deltan escreveu novamente a Moro, sugerindo que não tinha havido má-fé por parte da PF.
“Continua sendo lambança”, respondeu o juiz. “Não pode cometer esse tipo de erro agora.”
Deltan respondeu:
“Saiba não só que a imensa maioria da sociedade está com Vc, mas que nós faremos tudo o que for necessário para defender Vc de injustas acusações.”
Minutos depois de conversar com Moro no chat do Telegram, Deltan procurou o delegado Márcio Anselmo, que chefiava as investigações sobre a Odebrecht, e disse: “Moro está chateado.”
Anselmo respondeu horas mais tarde reconhecendo que tinha sido apressado, mas minimizou – ele não via motivo para “todo esse alvoroço”.
Deltan respondeu: “O receio é que isso seja usado pelo STF contra a operação e contra o Moro. O momento é que ficou ruim”, disse. “Vem porrada.”
No dia seguinte, Moro voltou ao Telegram e, numa conversa pessoal com Deltan, pediu que o procurador ajudasse a conter o grupo antipetista Movimento Brasil Livre.
Eles protestavam em frente ao apartamento do ministro Teori Zavascki em Porto Alegre, com faixas com os dizeres “traidor” e “pelego do PT”.
Moro teclou a Deltan:
“Não sei se vcs tem algum contato mas alguns tontos daquele movimento brasil livre foram fazer protesto na frente do condomínio do ministro. Isso não ajuda evidentemente.”
Deltan disse que tentaria se informar, mas ponderou:
“Não sendo violento ou vandalizar, não acho que seja o caso de nos metermos nisso por um lado ou outro.”

