Despacho de Conselheira do CNJ permite que agricultores da Coaceral averbem empréstimos em suas matrículas

Maria Tereza Uille Gomes, Conselheira do CNJ, exarou despacho agora, às 16h35m, por requerimento da Bom Jesus Agropecuária Ltda., para a Corregedoria Geral das Comarcas do Interior da Bahia, vazada nos seguintes termos: 

No documento de Id 3811211, o Corregedor das Comarcas do Interior do Estado da Bahia noticia que o Delegatário do Cartório do Registro de Imóveis de Formosa do Rio Preto “teria averbado a decisão da Desembargadora Ilona Márcia Reis, determinando o bloqueio da matrícula 2182, promovendo, após, a averbação da decisão [desta Conselheira], no sentido de abster-se de cancelar aquele ato, situação que vem impedindo a celebração de empréstimos por seus clientes com alguns agentes financeiros da Região Oeste da Bahia” (Id 3811211).

Em razão disso, pede “subsídio para a apresentação de solução à citada demanda, tendo em conta os termos das averbações promovidas e, em especial, considerando a possibilidade de repetição desse ato em várias outras matrículas daquela serventia, onde o Delegatário averbou o bloqueio, como determinado pela Desembargadora desta Corte de Justiça” (Id 3811211).
É o relatório.

Em resposta à indagação formulada, esclareço que a atuação da Desembargadora do TJBA não tem o condão de subverter a ordem emanada pelo Conselho Nacional de Justiça. Isto é, a determinação do bloqueio e suspensão da eficácia das matrículas 726 e 727 do Cartório de Registro de Formosa do Rio Preto e de todas as demais matrículas delas decorrentes, bem como a manutenção da validade e a eficácia da matrícula 1037, não prevalece sobre a decisão Plenária do CNJ.

Reafirmo a compreensão de que o ato[1] que cancelou as matrículas dos imóveis de nºs. 726 e 727 e seus respectivos desmembramentos, oriundas do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Santa Rita de Cássia/BA, e determinou a regularização do imóvel de matrícula 1037 (art. 4º da Portaria CCI 105/2015), assentada no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Formosa do Rio Preto/BA, é nulo de acordo com a decisão Plenária do CNJ (1º.3.2019).

Por consequência, se o aumento da área de terras (ampliação da área do imóvel de matrícula 1037, de 43.000ha para 366.862,6953ha) se deu por Portaria declaradamente nula, nenhuma decisão posterior é capaz de reverter essa ilegalidade – a suspeita de fraude e ilícitos penais é objeto de apuração em curso pelas autoridades competentes.

Conforme destacado na decisão de Id 3801154, o uso oblíquo da via jurisdicional para invalidar o
quantum deliberado pelo Conselho Nacional de Justiça não encontra ressonância no ordenamento
jurídico, sob nítida usurpação de competência do Supremo Tribunal Federal.

Com essas considerações, saliento ao Corregedor das Comarcas do Interior que as determinações/decisões expedidas contrariamente à deliberação do CNJ não produzem efeitos, tampouco impedem a eficácia dos registros dos imóveis.
Por oportuno, reforço a necessidade de atenção do Corregedor acerca das circunstâncias e matérias jornalísticas[2] divulgadas na data de 19.11.2019 a respeito de decisão do Superior Tribunal de Justiça que afastou magistrados do TJBA por “suspeita de venda de sentenças [e] também determinou a prisão de 4 suspeitos e o bloqueio de R$ 581 milhões em bens em investigação sobre legalização de terras no oeste baiano.”, que, em última análise, reforçam o entendimento de possível atuação ilícita do Poder Judiciário com o fim deliberado de esvaziar a atuação do CNJ.
Intimem-se.
Intime-se a Desembargadora Ilona Márcia Reis para, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, apresentar manifestação acerca da 1) desconsideração da decisão Plenária do CNJ de 1º.3.2019, quanto à ilegalidade da matrícula 1037, cuja área foi ampliada de 43.000ha para 366.862,6953ha;

2) da decisão proferida em 27 de junho de 2019 (Agravo de Instrumento nº 8008018-92.2019.8.05.000, Id 3795779), que restaurou os efeitos de liminar concedida pela juíza designada Eliene Simone Silva Oliveira (Autos 8000020-90.2017.8.05.0224) e revogou entendimento diametralmente oposto em decisão proferida no dia 30.4.2019 (Id 3795778);

e 3) da decisão proferida em 31.10.2019 (Autos 8008018-92.2019.8.05.0000, Ids 3809151 e 3795781), que determinou o cumprimento de imediato da decisão liminar que determinou
o bloqueio e suspensão da eficácia das matrículas 726 e 727 do Cartório de Registro de Formosa do Rio Preto e de todas as demais matrículas delas decorrentes, bem como a manutenção da validade e a eficácia da matrícula 1037, contrariamente à deliberação do CNJ.

Encaminhe-se, nesta ordem, cópia dos Acórdãos de Ids 3577907 (2310425, 3577908 e 3561406) e
3748759 (3747422, 3747423, 3747424); dos Documentos de Ids 3774335, 3805375, 3805376, 3805384, 3805385, 3795778, 3795779, 3795781, 3795876, 3774324; das Decisões de Id 3801154 (7.11.2019) e 3810746 (19.11.2019); e deste Despacho ao Ministério Público Federal e ao eminente Ministro Og Fernandes, do egrégio Superior Tribunal de Justiça, Relator da ação que apura possível atuação de organização criminosa em esquema de vendas de decisões para legitimação de terras no oeste da Bahia.

Maria Tereza Uille Gomes
Conselheira

Questão das terras da Coaceral tem muitos pontos a esclarecer

As áreas cujo domínio é discutido: o aumento do valor das terras depois de beneficiadas aumenta a cobiça.

A incrível história do borracheiro que virou latifundiário em Formosa do Rio Preto, no Oeste da Bahia, não para de surpreender.

Depois de dar uma sentença garantindo, no mérito, a posse de 366 mil hectares ao borracheiro José Valter Dias, a juíza Marivalda Almeida Moutinho escreveu que não era preciso cumprir a ordem da desembargadora Sandra Inês Azevedo, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), para suspender o processo envolvendo as terras.

Na decisão, Marivalda rejeitou pedido do Ministério Público de se manifestar, pois segundo ela a discussão não envolveria um conflito agrário. Também negou a solicitação de dezenas de agricultores locais de serem ouvidos no processo. Os agricultores estão nas terras desde a década de 1980, aonde chegaram contando com incentivos do Programa de Cooperação Nipo-Brasileiro para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer II).

Marivalda rejeitou ainda o pedido do Instituto Chico Mendes (ICMBio) de ingressar no processo. O instituto pediu para ser ouvido porque 50 mil hectares das terras demandadas por José Valter Dias formam uma reserva ambiental, a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins.

Para completar, Marivalda aplicou multa de R$ 1 milhão ao advogado Domingos Bispo, que alegou sua suspeição para julgar o caso. A lei determina que, quando uma parte aponta a suspeição de um juiz, este deve ou declarar-se suspeito ou remeter o incidente ao tribunal de segunda instância para avaliação. Marivalda, porém, não tomou nenhuma das duas iniciativas.

No incidente de suspeição, Domingos Bispo afirma que a juíza manteria vínculos com Adailton Maturino, que se apresenta como cônsul da Guiné-Bissau no Brasil (o Itamaraty negou que ele tenha esse título).

A mulher de Adailton, por sua vez, virou sócia de José Valter Dias em uma holding criada logo que ele virou o dono das terras. A holding vem cobrando de 20 a 80 sacas de soja por hectare de agricultores para que possam permanecer no local.

Já Marivalda foi embora de Formosa do Rio Preto assim que decidiu o caso. Passou apenas um mês na comarca, por designação do TJBA, que já apontou um outro juiz para atuar na região.

Marivalda ficou conhecida nacionalmente por absolver sumariamente nove policiais militares envolvidos na Chacina do Cabula, em 2015, quando 12 jovens foram mortos em Salvador. Ela tomou a decisão enquanto substituía o juiz responsável pela causa, que estava de férias.
Marivalda também chegou a ser afastada de suas funções em 2006, por acusações como despachar processos com a intenção de favorecer terceiros e movimentar, em sua conta bancária, valores superiores à sua renda anual. O processo terminou arquivado.

CNJ adia mais uma vez questão da Coaceral, após pedido de vista do processo.

O relator, ministro corregedor, João Otávio de Noronha, ratificou, em seu voto, a liminar concedida aos produtores
O relator, ministro corregedor, João Otávio de Noronha, ratificou, em seu voto, a liminar concedida aos produtores

Na tarde de hoje aconteceu a 242ª sessão do Conselho Nacional de Justiça. Uma decisão do pleno do CNJ sobre as questões de terras na Coaceral foi adiada por um pedido de vista do processo.

O ministro corregedor João Otávio de Noronha, relator, ratificou, em seu voto, a liminar obtida pela Agropecuária Bom Jesus e outros, no sentido de cassar portaria administrativa do juiz de Formosa do Rio Preto, Quadros Sampaio, que emitia na posse de 340 mil hectares, nas matrículas 706 e 707, José Walter Dias e seu filho, Joilson Dias.

Segunda o ministro Noronha “jamais se poderia fazer a emissão na posse através de uma portaria administrativa”:

“Diante da exorbitância, concedi a liminar e proponho a ratificação, tendo em vista a violência da medida tomada pelo Juiz da Comarca. O conflito de posse deverá ser dirimido dentro do devido processo”.

O Ministério Público da Bahia e o Conselho de Magistratura investigam o processo desde 2004.

Em setembro, a decisão administrativa do juiz Quadros Sampaio gerou sérios problemas na região, com seguranças particulares e oficial de justiça impedindo a entrega de sementes, combustível e adubos nas propriedades envolvidas. Instado pelo ministro Noronha, o magistrado mandou retirar as barreiras, permitindo que os agricultores voltassem ao preparo e plantio de suas terras.