
Os filhos existem para explicar a vida aos pais. Ontem, meu filho Cassiano, que não por acaso é irmão de um Caetano (Sampaio), ligou-me para me contar sobre o sentido da música Cajuína, de Caetano Veloso, que abalado com o suicídio do poeta Torquato Neto foi a Teresina visitar seus pais. E lá, ao chegar, num acesso de choro, foi consolado com alentadas doses do refrigereco Cajuína. Torquato, poeta e um dos inventores da Tropicália, se matou um dia depois de seu 28º aniversário, em 1972. Depois de voltar de uma festa, trancou-se no banheiro e abriu o gás. Sua mulher dormia em outro aposento da casa. O escritor foi encontrado na manhã seguinte pela empregada da família. A importância do poeta que compôs com todos os talentos da música popular da época (Jards Macalé, Gil, Caetano, Luiz Melodia) e viveu os tempos obscuros do exílio dos tropicalistas desenha-se na figura de um gênio precocemente desaparecido.
Explicada a letra, explicada a vida, resta apenas o grande talentos dos poetas maranhense e baiano na letra de Cajuína:
“Existirmos a que será que se destina
Pois quando tu me deste a rosa pequenina
Vi que és um homem lindo e que se acaso a sina
De um menino infeliz não se nos ilumina
Tão pouco turva-se a lágrima nordestina
E apenas a matéria viva era tão fina
E éramos olharmo-nos intacta retina
Da cajuína cristalina em Teresina”.

O bilhete do suicida, na íntegra: “Tenho saudade, como os cariocas, do dia em que sentia e achava que era dia de cego. De modo que fico sossegado por aqui mesmo, enquanto durar. Pra mim, chega! Não sacudam demais o Thiago, que ele pode acordar”. Thiago tinha dois anos quando Torquato se matou.
Frase de Torquato: “Escute, meu chapa: um poeta não se faz com versos. É o risco, é estar sempre a perigo sem medo, é inventar o perigo e estar sempre recriando dificuldades pelo menos maiores, é destruir a linguagem e explodir com ela (…). Quem não se arrisca, não pode berrar.”